Todavia novos olhares para a questão da saúde - que como quer Winnicott - surge o espaço transicional que reúne o subjetivo e o objetivo. Surgem novos conceitos, apesar do bulling da sociedade de controle que se vive no presente, como o bordeline na pós-modernidade e holding de um novo homem, o homem do devir e da resposta à permissividade. Novos paradigmas da complexidade científica: salutogênese, musicoterapia, anamnese sonoro-musical. Uma das consequências desses temas de se tornado popular, é a adoção de enfoques completamente diferentes. Surge a discussão sobre o papel das ciências humanas no processo de reflexão crítica nas ciências da saúde (algo que, nas últimas décadas, tem ganhado crescente espaço e interesse). Temas como a bioética, a humanização e a formação humanística do profissional da saúde por um lado e novos campos e perspectivas de pesquisa historiográfica e filosófica e de áreas ligadas às ciências humanas, por outro, são assuntos cadentes que exigem um esforço contínuo de análise e reflexão.
Vivemos uma sociedade unida pelo mercado de consumo. Um individualismo de escolhas valorosas. A fragmentação e a multiplicidade identitária de transcendência são características da moderna sociedade. Uma sociedade de consumo em que a ciência biológica tem seu ápice. Tecnologia e mercado. Pergunta-se agora o que é vida? O que é ser humano? Qual é o limite? Quais os critérios? Alguns pensam até abandonar o humano e ligar-se ao transhumano. Surgem dilemas éticos do avanço das ciências e seus efeitos. A Eugenia moderna, antes tida como aprimoramento e manipulação genética, é agora um equacionamento de sua aplicação. A cultura da introspecção (FREUD), a invenção da interioridade, do homem dissociado, em conflito, é substituído no século XXI pela experiência do sofrimento. Deixa de ser enigma para ser disfunção, inoperância, desajuste, calcionada pela biologia do cérebro. Agora impera a intervenção sobre o corpo e pela psiquiatração da vida. A vida que era um mistério, agora é manipulada numa sociedade de controle. A ciência é fástica para produzir novas realidades. Estamos vivendo um novo tempo de grandes transformações em que a humanização biológica é passado. Constrói-se o sujeito cerebral com a fisicalização do sofrimento e do tratamento e explicações biológicas e cerebrais, até de emotion. Seus efeitos? Além do reforço de despolização do sujeito e da bipolaridade da vida que viviamos antes, criam-se e multiplicam-se seres imediatistas e consumidores (Há mercado para tudo!). Todos somos atraídos sutilmente por essas novas ideias com a reação de sofrimento e medicalização de fármacos produzidos por esta mesma sociedade. Não temos ideia do que isso repercute e suas consequências.
a saúde e a medicina têm vindo a ocupar um lugar importante na pesquisa em ciências humanas. O crescimento das contribuições para este campo caracteriza-se pela diversidade temática, disciplinar, epistemiológica, teórica e metodológica e pela proliferação de publicações, departamentos e cursos especializados, para além da presença cada vez mais visível em publicações “generalistas”, tanto das ciências sociais e humanas como das ciências da saúde. As transformações das ciências biomédicas e o seu impacte nas definições da doença, da saúde e dos cuidados de saúde; a participação dos usuários nas atividades e debates sobre medicina e saúde em diferentes tradições e contextos políticos; a coordenação nas organizações de saúde, especialmente o papel das tecnologias de informação e comunicação; as articulações da saúde com problemas sociais e políticos; a dimensão simbólica da biomedicalização com a reconstituição da economia política do setor da saúde; a ênfase crescente na própria saúde ( e não preferencialmente na patogênese), a chamada salutogênese e a elaboração de biomedicinas do risco e da vigilância ... A importância crescente da tecnologia e dos saberes das ciências de vida na medicina, inclusive na medicina complementar e em terapias alternativas ou não-convencionais.
É notório constatar as transformações na produção, distribuição e consumo dos conhecimentos biomédicos e da gestão da informação médica. Assim, acredito que seja crucial o estudo e reflexão na saúde e educação sem esquecer das ciências humanas na formação do profissional de saúde. A escolha pela salutogênese e pela musicoterapia não foi em vão. Cada vez mais forte a atuação das terapias complementares na medicina tradicional, só vem determinar e nortear o ser humano para outras fontes de cura.
Vivemos um século de pungentes transformações dos corpos, atribuindo-lhes novas propriedades e produzindo novos atores e identidades coletivas e tecnocientíficas. Novos paradigmas da complexidade científica: biomedicalização, biossocialidade, biopoder. Biomedicalizações que permitiram criar capacidades, sem precedentes, de manipulação da vida. Biomedicalizações que permitiram criar novas identidades cuja existência decorre das próprias intervenções científicas e médicas, tais como os embriões in vitro, as células-tronco embrionárias, mães de aluguel, doadores de gametas para reprodução, medicamente assistida, doadores e receptores de órgãos para transplantes, os sorospositivos, portadores de características genéticas detectáveis através de novos meios de diagnósticos, etc.
Cabe aqui, neste momento, uma redefinição de conceitos como o que é doença e o que é saúde, o que é pessoa doente e a própria internação médica, pois conceitos de saúde e de doença deram aos médicos o poder de manejar vidas e criar uma tecnologia médica que cada vez mais consome recursos.
As indústrias médicas nascidas do progresso científico, uma gestão hospitalar irracional, a intervenção das multinacionais na indústria farmacêutica mundial, a doença transformada em mercadoria de consumo são mecanismos que contribuem para fabricar doentes numa sociedade de consumo submetida a uma economia inflacionária e em crise. Bolhas financeiras que resultam de uma combinação de euforia, falta de regras, desconhecimento de muitos e esperteza de poucos. Quando estouram, produzem crises doloridas. A atual interrompeu a fase mais veloz de criação de riqueza da humanidade. O fim de um ciclo que avalancou mais de 400 milhões de pessoas da miséria. Crises são frequentes, resultado da combinação entre ganância, irracionalidade num mundo bipolar que vivemos hoje. A confiança no biopoder e na fragilidade das ciências deram crédito a uma sociedade em busca do corpo perfeito e da arte de ver e não enxergar os excessos que alimentam a sociedade de consumo.
A atração crescente pela mágica da tecnologia médica moderna, vinculada pelos meios de comunicação de massa, criou a demanda pública por curas milagrosas, como se a meta da saúde para todos pudesse ser cumprida por uma programação de transplante cardíaco para todos.
Na realidade, a ciência médica, os doutores e os hospitais podem salvar algumas vidas à custa de enormes dispêndios com retornos precários em matéria de saúde. Criou-se o mito da ciência médica que acessa com as benesses da cura para todos, das doenças aos homens esmagados pela tecnologia industrial. Criou-se o mito da ciência médica através do qual os médicos e as indústrias de equipamentos e de drogas que lutam por lucros crescentes e por permutas em benefícios próprios.
Nesse esquema, Octávio Bonet, em seu livro SABER E SENTIR: uma etnografia da aprendizagem da biomedicina, descreve o infortúnio, a doença e a morte. Uma reflexão antropológica da etnografia da formação médica contemporânea. Ele descreve em seu livro os dilacerados estudantes de medicina entre a incorporação de um saber objetivo, impessoal e frio, envolvidos em prática que não pode prescindir do afeto e da empatia em dramas sociais vividos por eles e pelos pacientes. Experimentei isso também quando fiz duas disciplinas da Medicina: Psicologia médica e Antropologia Médica e ainda como estagiário de Técnico de Segurança do trabalho do Hospital Albert Sabin e de um CAPs da cidade de Juiz de Fora, onde atuava com minha anamnese sonoro-musical e projeto de inteligência musical (conexão música-educação-saúde), com um sonho de ser um musicoterapeuta. Naquele momento, senti que os acadêmicos de medicina não estavam preparados para atuarem na nova sociedade, pois separavam fatos e valores. Aprendiam a ser afetuosos na teoria e frieza na prática. Na busca por novos olhares, tive a grata oportunidade de ler as obras do Dr. Jayme Landamann que há anos vinha se batendo por uma reformulação da assistência médica no Brasil, apontando-lhes os erros, que vão desde o ensino da medicina até o enfoque de nossos problemas de saúde. Livro bastante atual já no próprio título: PROMOVENDO A DOENÇA E EVITANDO SAÚDE. Um alerta a todos nós contra a injustiça social, a falta de saneamento básico, a poluição industrial e o desemprego; algumas das enfermidades que enfrentamos ainda no século XXI e constatadas por nós seja como cliente, paciente, profissional da saúde, usuário, como cidadão. Algo que nos deixam preocupados com a formação destes profissionais que direta ou indiretamente estão envolvidos com a dicotomia saúde/doença.
Um estudo de cunho antropológico dos sistemas de prevenção e ações básicas em saúde pode constituir-se como uma fonte importante de conhecimentos por situar-se numa área em que se evidencia com especial clareza o encontro dos subsistemas culturais da medicina ( com suas teorias, crenças e ritos próprios) e da população assistida ( com sistemas de interpretação em que concepções assimiladas do saber médico e outras que ora se remodelam, ora resistem, ora concorrem com as teorias médicas). Do ponto de vista da antropologia, o interesse pela prevenção pode ser resumido a dois aspectos:
- A possiblidade de o conhecimento dos modelos adotados para a prevenção retratar com clareza como se organizam e se ordenam os conhecimentos da medicina acerca dos processos de saúde e doença. É uma parte essencial para a investigação por possibilitar estudos de diagnósticos de situação, necessidades e demandas de populações distintas através de informações descritivas, o que tanto pode nos dar novos ângulos de análise comparativa da composição de curvas de morbidade e mortalidade, quanto facilitar o entendimento de marcos da linguagem e crenças sobre saúde não mais incluídas nas referências em que se apóia o pensamento médico formal.
- A maneira como se vai formando uma nova cultura fortemente influenciada por um giro nas concepções de saúde cujo resultado parece ser uma vasta medicalização da vida quotidiana implicando algo como uma nova religião, a eco-bio-religião, com suas exigências de ascese, seus rituais de purificação e suas promessas de felicidade, e que pode ser resumido no ideal da saúde perfeita.
As aulas no curso de especialização Ciências Humanas e Saúde na UFJF só vieram engrossar o tema. Cada vez mais interessei-me pelo assunto saúde. Saúde e doença, apesar de sua importância na vida cotidiana e apesar das discussões que provocam, são difíceis de definir e analisar sem uma reflexão atenta sobre seu significado real, que é complexo e profundamente ambíguo.
Segundo Jayme Landmann, a Medicina, antes da renascença, era até então considerada uma erudição mágica de uma aplicação prática da sabedoria popular e o doutor curava pelo efeito placebo de seu carisma. Com Descartes, o corpo humano trabalhava como uma máquina, mas principalmente por separar no ser humano duas substâncias: uma material e corpórea ( o corpo) e outra imaterial ou incorpórea ( a alma). A medicina ficava relacionada com a parte corpórea, limitando assim a natureza e a fronteira de suas ações. As doenças passaram a ser definidas como relacionadas somente com o corpo em consequência de alterações da máquina humana, em seus órgãos e aparelhos. A alma era situada à parte e pertencia a Deus.
Esse conceito cartesiano foi reforçado consideravelmente pela medicina hospitalar do início da era industrial, em meados do século XIX. A revolução industrial e o processo de urbanização criaram os grandes aglomerados humanos não-sadios e, como consequência, o estabelecimento de hospitais enormes para abrigar os doentes, de modo a evitar que seus males contaminassem a população da escala social mais alta ou ameaçassem a estrutura social vigente.
A criação dos hospitais como função social para isolar os doentes pobres, dar-lhes algum amparo na doença e impedir a ameaça que eles representavam para o resto da população gerou uma reviravolta na relação médico-paciente. De dominadores, os pacientes passaram a ser dominados. O paciente perdia no hospital sua personalidade e seus atributos. Por outro lado, os médicos se tornavam mais organizados. Como profissão, tinham posições e status mais elevados, além do domínio da perícia e do conhecimento. O paciente tinha de submeter-se a todas as práticas exigidas pelo médico. Quando não resolvidas pelos médicos eram confirmados no post-morten através da autópsia. O paciente deixava de ser uma pessoa para ser um caso. A doença tornou-se mais importante que o doente. É a chamada “era da anatomia patológica”.
A medicina hospitalar criou as bases práticas da medicina mecanicista e orgânica através da definição da doença como consequência de uma patologia localizada, ou seja, do mau funcionamento de uma parte do corpo. Os médicos procuravam esmerar-se em correlacionar os sintomas subjetivos e objetivos dos doentes que eles captavam com as alterações que confirmariam após a morte ou a exploração cirúrgica. Surge a medicina preventiva, a medicina na era científica. Nasce a medicina laboratorial para reforço da medicina hospitalar. Agressão externa comprovada atingia determinados órgãos e tecidos, produzia doença e poderia ser prevenida, erradicada e combatida.
A célula vasculhada pela microscopia eletrônica tornou-se o foco central para a compreensão da doença. A não-restauração da saúde ou a própria doença deveriam ser atribuída ao relapso do paciente que não procura só como médico a tempo, que desobedece aos cuidados recomendados, ou ao atraso tecnológico da medicina, que acabaria por ser ultrapassado.
A medicina curativa minimiza as medidas preventivas, as quais, para serem substancialmente efetivas, interfeririam como processo de produção e prejudicariam os interesses econômicos existentes. A medicina curativa, em seu aspecto atual, é a base de uma nova corporação econômica, lucrativa e espoliativa – a indústria de equipamentos e ao empresariado médico, concorrendo, assim, para o acúmulo de capital e para o reforço da estrutura social vigente.
O acesso a uma medicina sofisticada constitui uma vitrine ilusória de suporte do sistema a meu ver. Melhorar o nível de vida das populações, reduzir cargas estressantes de trabalho e aumentar o lazer, poderiam trazer ao ser humano uma maior qualidade de vida, porém acredito que mesmo assim não estaríamos imunes as doenças e as epidemias.
Como se observa, os primórdios da medicina gera a medicina individualista e a medicina coletiva. Vale aqui lembrar o mito grego das filhas do deus Asclépios: Panaceia e Higeia. Panaceia, a padroeira da medicina curativa, prática terapêutica, baseada em intervenções sobre indivíduos doentes, através de manobras físicas, encantamento, preces e uso de PHARMAKON (medicamentos) e Higeia, a harmonia dos homens e dos ambientes: a saúde. Ações preventivas, mantenedoras do perfeito equilíbrio entre os elementos fundamentais: terra, fogo, ar, água. Higiene e higiênico. Promoção de saúde, principalmente no âmbito coletivo.
Os herdeiros de Hipócrates trataram de reprimir o espírito da primazia do coletivo e estabeleceram o individualismo na ilha de Cós. Desta forma, buscavam garantir a hegemonia de sua prática frente às inúmeras seitas que, na antiguidade, prometiam a saúde para os homens. Neste sentido, a protoepidemiologia morreu com os filhos de Hipócrates, que revelaram um eficiente senso mercadológico e rapidamente se adaptaram aos tempos pós-helênicos através de um conveniente resgate de Panaceia, a zelosa deusa do individual, como referência para a prática. As diferentes formações ideológicas que se sucederam no mundo ocidental de fato não chegaram a propociar as condições para uma medicina do coletivo.
No início da Idade Média, tanto a hegemonia do catolicismo romano quanto as invasões dos bárbaros trouxeram um predomínio de práticas de saúde de caráter mágico-religioso. Amuletos, orações e cultos a santos protetores da saúde materializaram a ideologia religiosa, caracteristicamente medieval, de salvação da alma individual. A prática médica para os pobres era exercida principalmente por religiosos, como caridade, ou por leigos, barbeiros, boticários e cirurgiões, como profissão. Cada família da aristocracia teria seu médico privado que, em muitos casos, era um cortesão especialista também na arte de matar por envenenamento.
Thomas Sydenhan (1624-1689), médico e líder político londrino, é considerado o fundador da clínica moderna, para a tradição anglo-saxônica. Curiosamente, para a tradição francesa historiográfica, os primeiros passos para uma medicina dos tempos modernos se conecta a uma questão veterinária. Michel Foucalt (1979) nos refere que a Sociétè de Médicine de Paris, fundadora da clínica moderna nos século XVIII, organiza-se a partir da ordem real para que os médicos investigassem uma epizootia que periodicamente vinha dizimando o rebanho ovino, com graves perdas para a nascente indústria têxtil francesa. Nem mesmo o hospital foi um lugar para os enfermos. Servia para asilo ou acolhimento. Locais protegidos sob o mandato de ordens religiosas, sendo a primeira delas a dos cavaleiros hospitalários, que remontava às cruzadas e que originou o termo “hospital”, local destinado a receber viajantes, necessitados, aqueles que não tinham casa e, eventualmente, doentes sem família.
A conquista do espaço político dos hospitais foi determinante para o desenvolvimento da clínica moderna, de base naturalista e sistematizante. Pode-se citar três etapas: i) Não se verificava uma distinção muito clara entre as dimensões individual e coletiva da saúde; ii) Arte-ciência clínica reforçava ainda mais o estudo unitário a partir da investigação sistemática dos enfermos enfim recolhidos aos hospitais; iii) Emergência da fisiologia moderna. Claude Bernard (1813-1878) estruturada a partir da definição das patologias (e suas lesões) no nível subindividual.
A hegemonia da biologia experimental, advento da teoria microbiana da medicina científica, é um marco importante no papel da institucionalização das práticas médicas contemporâneas, por meio do famoso relatório Flexner.
A estatística, a quantificação das enfermidades representaria um elemento metodológico distintivo da nova ciência, servindo ao mesmo tempo como garantia de sua neutralidade epistemológica.
A Medicina Social vê a saúde como questão eminentemente social e política, aliada a uma preocupação sociológica e a um profundo engajamento nos processos de transformação da situação de saúde. A ideia sanitária. Na Inglaterra, é conhecida como a medicina da força de trabalho. Na França, com a revolução de 1789, implantou uma medicina urbana com a finalidade de sanear os espaços das cidades, ventilando as ruas e as construções públicas e isolando áreas consideradas miasmáticas (Foucault, l979). Na Alemanha, Johann Peter Frank (1745-1821) sistematizava as propostas de uma política médica baseada em medidas compulsórias de controle e vigilância das enfermidades, sob a responsabilidade de Estado, junto com a imposição de regras de higiene individual para o povo. A Medicina Social, consolidada no final do século XIX possui como rival a medicina científica.
Século XIX, flores narcísicas do mal, novos rótulos malditos, realidade grotesca à linguagem sublimada da celeuma contemporânea. A hostilidade dos dias de hoje e a hipocrisia imoral dos valores reinantes. Pensar é causar, subentendam-se transformações pessoais e sociais.
As flores doentias do século XXI podem dar lugar as flores do bem, tão prometidas em forma de qualidade de vida, de cura e perfeição? Só o tempo dirá. Para que aconteça devemos mudar o olhar e prestar atenção a nossa saúde e a a nossa alma. Aos remorsos gentis, nos damos de comer como o mendigo nutre a sua sordidez. Frouxo é o arrependimento e tenaz o pecado. Lavar as manchas com pranto amaldiçoado. O objeto repugnante é o que mais nos agrada. Mundo aborrido. Crispa na mãos para Deus que o escuta condoído. Maldita a noite a das alegrias efêmeras (baladas, as drogas, alucinantes, medicalização sintética, biopoder,...).
Devemos voltar-se ao ser humano contemporâneo, que ainda vive a partir do medo e da angústia de nossos tempos. Esse homem dividido, dissociado de sua verdadeira essência, que constrói relações doentias e as vezes colhe flores do mal, seja com os demais seres humanos, seja com a ecologia e, especialmente, em relação ao outro. Essas relações doentias, por sua vez, repercutem e se voltam novamente contra si mesmo, oprimindo-o e tirando-lhe possiblidades de vida autêntica e verdadeira.
As ciências Humanas e da Saúde às vezes rege este concerto equivocado, quando não vai ao encontro deste ser humano que, na verdade, está buscando por uma força que lhe tire sua angústia de ser. Ao invés de libertar este ser humano aprisiona-o ou interrompe-o, ofuscando a verdadeira essência para chegar a soluções de seus problemas. Voltar-se para a interioridade do ser humano é encontrar-se com um tesouro acumulado ao longo do desenvolvimento da humanidade, sob imagens, símbolos e arquétipos, cujo acesso é a essência do verdadeiro conhecimento sadio.
Por tudo isso, a postura do profissional da saúde não está garantindo por si só maior mobilidade à agilidade do futuro profissional. Trabalhar este ser humano em formação como uma pessoa inteira, com sua expressão, seus sentidos, criatividade, inteligência, emotion, razão e desejo se torna urgente. Manter a relação dialógica do profissional da saúde com o profissional das ciências humanas é fundamental e coerente com a realidade. Este olhar trará relevância para nosso mundo cada vez mais plural, diversificado, vário e pluri-cultural, emorracional. Surgirão novos modelos, novos paradigmas.
Para que os eixos de pesquisas se desenvolvam cada vez mais, torna-se necessário aquela transformação das ciências biomédicas e o seu impacte nas definições da doença, da saúde e dos cuidados de saúde em conferências, debates, palestras e cursos especializados, derrubando barreiras do individualismo de cada ciência. A participação dos usuários nas atividades e debates sobre medicina e saúde em diferentes tradições e contextos políticos é essencial para o diálogo e pra que realmente aflore soluções para problemas de várias ordens. A coordenação nas organizações de saúde, especialmente à que cabe ao papel das tecnologias de informação e comunicação, para que descortine as articulações da saúde realmente preocupadas com questões sociais e políticas em que passa, por exemplo, a medicina e a saúde como um todo, assim como a medicina complementar e terapias não-convencionais.
O homem excepcionalmente dotado não é apenas unilateral, muito frequentemente dá mostras de notáveis insuficiências em outros domínios que deveriam desenvolver também, como sua percepção sensorial mais forte. Diferentes olhares que façam desenvolver o seu potencial maior: visual, auditivo e/ou cinestésico.
Quantas vezes vemos o brilhantismo e o talento de autores, profissionais das diferentes áreas, acadêmicos chegarem ao estrelato, virarem celebridade e até pessoas deficientes que limitadas em seu desenvolvimento e que chegaram ao ápice. Não pode existir alegria maior que a de perceber que podemos, ainda, chegar a resultados incríveis a partir de faculdades que adormecem em nós. Nosso potencial é imenso. Somos todos inteligentes e deficientes em múltiplas situações. Devemos descortinar nossas mentes e tentar o quanto antes desenvolvê-los. Esta é minha proposta nesta dissertação.
Estímulos, perspectivas, orientações e estudos destinados a despertar nos profissionais de saúde, de humanas ou de exatas o desejo de prosseguir seriamente na sua nutrição espiritual e emocional, de se tornar um gastrônomo da vida e da arte, no que tange ao conhecimento, ao estudo e no desenvolvimento mais aprofundado de faculdades e de nossas múltiplas inteligências.
Em nossa contemporaneidade é premente entender o que acontece na nossa sociedade e os caminhos trilhados e/ou que serão trilhados são vitais. A construção e o descortinar se faz a todo tempo, assim como as releituras e as desconstruções. Vivemos não mais de obras acabadas, mas em work in process. O mundo está num ludismo em que até os objetos de arte, que imitam a vida, não possuem materialidade definida, haja vista a arte conceitual que impera nos nossos dias e que nos chamam a atenção para refletirmos sobre o mundo. Produzimos sistemas, onde projetos científicos ou não podem ser nada menos que acaso acabado. O distanciamento que ocorria na modernidade agora é feito com participação e interação em diálogo concordante ou discordante. Fala-se até de uma inteligência coletiva (Levy). Assim, a centralização de antes é substituída pela dispersão e diferentes olhares, para uma determinada coisa. Estamos agora em rede, globalizados. Não há mais uma raiz, mas um rizoma, uma rede de ideias, conceitos, em constante diálogo, releituras, nunca acabado na sua totalidade. Há releituras de valores, conceitos, paradigmas, etc. As coisas são híbridas, sofrem mutações. Impera a ubiguidade. Não há mais negação do passado, mas sim a releitura. A parodia da modernidade é agora substituída pelo pastiche. A transgressão da modernidade é feita na contemporaneidade sem rupturas. Pierre Bourdieu, em excepcional análise de formas de classificação intersubjetiva entre indivíduos modernos, mostra (contrariamente ao processo homogeneizador) a diferenciação simbólica entre as classes e os segmentos de classe naturaliza-se objetivamente em tipos diferenciados de gente. Tal fato causa impactos psíquicos profundos na medida em que afeta a condição emorracional dos homens concretos, dificultando o desempenho individual nas relações diante do outro, principalmente quando o outro é alguém favorecido pelos signos da distinção. O corpo é identificado como principal portador e reprodutor de diferenças hierarquizantes socialmente construídas. É na aquisição do habitus, que para Bourdieu , se dá este processo.
No diálogo desta complexidade científica, duas esferas intersubjetivas para construir auto-estima e autoconfiança, cruciais na vida quotidiana: as relações profissionais e as relações afetivas. Questões que estão no cerne de nossa existência. Os padrões de beleza e de perfeição são critérios estéticos de classificação tornam-se signos de classificação naturalizados na sociedade ocidental moderna, frutos que podem lograr eficácia. Na linguagem biológica, estes signos são étnicos e genéticos que estão culturalmente classificados em uma hierarquia muito bem definida no imaginário coletivo, condicionando nosso olhar diante das formas físicas do outro e de nossa própria.Há claramente uma classificação estética arbitrária pautada em diferenças físicas.
Esta hierarquia possui uma origem complexa. No mundo ocidental, temos como belo o modelo físico do europeu, em consequencia do fenômeno eurocêntrico da colonização, em detrimento dos demais tipos físicos. Este padrão se desenvolveu na medida em que se consolidou, nas nações colonizadas, um modelo de sociedade desigual dominado pelos arianos europeus. Sendo assim, a afirmação da imagem do europeu como mais evoluído, superior, inteligente e belo, é fundamental para a eficácia simbólicva da distinção social estética. A afirmação da imagem, na verdade, é uma naturalização de uma hierarquia entre corpos mais perfeitos e menos perfeitos. Cor de pele nem sempre consiste no critério mais importante dessa classificação, vai muito além disso, está relacionado a biotipos e traços gênicos.mas também em tipos de comportamento e em modismos, ao monopólio do “gosto” (Bourdieu). Cria-se uma espécie de capital estético que pode influenciar inclusive a saúde do indivíduo e impactos psicossociais na relações (baixo auto-estima e frustações, sensação de fracasso ou sucesso pessoal e moral nas sociedades modernas.).
No campo afetivo, as consequencias emocionais da distinção estética são igualmente avassaladoras, pois as relações afetivas tocam na dimensão primária de nossa natureza. Levam à depressão e até a morte. O condicionamento do olhar pode ser bem percebido na fragilidade das relações afetivas modernas, onde interesse individual socialmente condicionado privilegia a valores perfeitos, sem anomalias. Igualdade também é uma questão moral. O acréscimo desta perspectiva em nossa autopercepção é um avanço indispensável na luta conta as desigualdades modernas.
Quanto mais presente estão o elemento utópico e os ideais emancipatórios num determinado momento histórico, maior a inclinação dos profissionais da saúde para o polo da subjetividade e da cultura. Em contra partida, quanto mais presente a crença de que a sociedade é como é, sendo um exercício pretender que ela venha a ser de outro modo, mais forte é a inflexão do profissional da saúde a colocar ênfase nos dados da objetividade e da natureza. A proliferação de novas patologias ( que não se encaixam e impõem sucessivos rearranjos da nosografia), a banalização do uso de pscofármacos como os antidepressivos, a decepção com as promessas não cumpridas da nova doutrina, a fuga para sistemas marginais religiosos, exotéricos ou anti-científicos (entre elas a psicanálise e outras formas de terapia), etc. Compõem um quadro ainda não devidamente desvelado como sintoma de um mal-estar diante de uma medicina e terapias obsecadas por escalas e incapaz de compreender que, por mais que se esmague o sintoma mental sob pilhas de antidepressivos, persistirá, nas palavras de Foucault, a indignação do homem sobre os seus fantasmas, sua relação com seu impossível, a loucura que se obstina como uma infelicidade que só encontra algum sentido quando um sujeito (psquiatra) mostra-se disposto a ouvir outro sujeito (paciente) e dar-lhe a oportunidade de trocar sua dor por uma narrativa.
Neste contexto pós-moderno, falarei da medicina complementar, mas especificamente de uma ação terapêutica – a musicoterapia, que acredito ser uma nova (ou velha?) terapêutica para os dias de hoje. Falarei da salutogênese que é outro olhar para a questão do corpo e saúde. Segundo Aarn Antonovsky, forças que geram saúde, se opõe a patogênese onde admite que, caso fossem pontencializadas as formas que se opõem ao estímulo causador das doenças, seria possível evitar que pessoas adoecessem. Estimular e preservar esta força, através da ciência, pela chamada salutogênese é seu objetivo.O senso de coerência, estado de harmonia e bem-estar com o meio social, familiar e consigo mesmo é ato de confiança interna e externa que forma um ambiente saudável, de alta probabilidade de êxito de vida. A teoria da salutogênese diz que reforçando os valores fundamentais do ser humano, como as relações familiares, a espiritualidade, hábitos de vida saudáveis, acesso à informação e isso associado à prática regular de métodos para voltar ao equilíbrio e proteger-se contra o estresse está criado o ambiente para a salutogênese. Falarei também sobre anamnese sonoro-musical, como proposta investigatória, elaborada por mim e baseada na Teoria das Múltiplas Inteligências de Howard Gardner e no método Bonny das Imagens guiadas e a Música (IGM).
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